terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Fanatismo


Florbela Espanca

Minh'alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer razão de meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!

Tudo no mundo é frágil, tudo passa..."
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, vivo de rastros:
"Ah!  Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: princípio e fim!..."

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Bandeira Nacional

                                        " um dia perfeito! "
Dia da Bandeira Nacional, um dia perfeito!
Nesse dia as âncoras vão subir,
O convés será lavado,
O Capitão, com sua perna de pau,
Irá convidar toda a gente,
Cantando e dançando,
De um lado para outro,
Com seu lustroso bigode azul.
Dia da Bandeira Nacional, um dia supimpa!
As crianças vão correr atrás de balas
Em todas as praças do país,
E seus pais vão caminhar de mãos dadas,
Com um sorriso besta nos lábios,
Acreditando que somos todos felizes,
E que há muitos peixes no mar.
Dia da Bandeira Nacional, um dia picante!
As meretrizes vão dançar cancan nas ruas,
Com suas pernas à mostra pra quem quiser tocar,
Pra quem quiser fotografar,
Pra quem quiser casar e tê-las como esposas,
No Dia da Bandeira Nacional!

Acreis, 28/01/2013, Sta Cruz/RJ

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

JAMAIS CONHECI UMA GAIVOTA AGRADÁVEL

ONDE SERÁ QUE SE ESCONDERAM AS ESTRELAS
NESTE CÉU INFINITO?
ONDE ESTARÃO AS DANADINHAS?
CERTA NOITE SAÍ COM MEU AMOR
E REPAREI NO SEU ANDAR DE PATO
ELA ME PERGUNTOU SEU EU TINHA
ALGUMA COISA DENTRO DO CRÂNIO
NADA FALEI
ESCUTEI ELA DIZER
QUE HAVIA OUTRO HOMEM EM SUA VIDA
COMO BOA FARSANTE
FICOU LASTIMANDO
A VIDA INFELIZ QUE LEVAVA
FINALMENTE BRADEI
DANDO-LHE UM TAPA NO PESCOÇO
E ELA SEM PESTANEJAR
ESBOFETEOU-ME E SUMIU
NAS RUAS INFERNAIS DE PARIS

 
Acreis, 25/01/2013, Belford Roxo
P/Iolanda, avec amour

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Chove Tanto Em Minha Vida


" Em minha vida chove sem parar." 

Chove tanto em minha vida.
Em minha vida chove sem parar.
Não há mais flores viçosas
Nem alegres,
O que há são folhas mortas.
O que se vê são densas nuvens
Que impedem  que eu veja teu rosto
Ou dele me lembre...
Há quem se orgulhe em ser fraco
E de temer coisas desconhecidas...
Eu vou à rua e misturo-me com a chuva.
Tenho ímpetos de dançar,
De ter prazer sem contato,
Indefinível desejo de volúpia,
Sentimentos sem medo algum
De ficar desnudo,
Lascivo e cheio de gozo.

Acreis, 19/06/2012, Sta Cruz/RJ

sábado, 19 de janeiro de 2013

Escuridão da Noite - IV

Margarida, flor da minha essência, labareda em minha carne, a minha alma é sua! Nasci certa feita em Paris, em 03 de janeiro de 1910, numa salada de genes raciais: minha mãe, cidadão suíça, descendente de franceses e austríacos, com uma cachimbada de Danúbio nas veias. Meu pai, negociante de vinhos, jóias e sedas, nasceu também em Paris, também em janeiro, no ano de 1880. Quando nasci, apesar de todas as vantagens, nossa família teve um acentuado prejuízo econômico. O Rio Sena, aparentemente calmo e controlado, foi o responsável por inundação  nas suas margens, tornando a cidade vulnerável á subida de suas águas. Naquele inverno de 1910, Paris ficou parcialmente submersa, deixando pairar a dúvida em nossa gente se iria eventualmente afundar (lembro-me dos barquinhos de papel), estando ainda presentes em nossas memórias as imagens desse acontecimento. Em 1910, Paris era o centro da vida cultural e intelectual da França, para não dizer de toda a Europa. A Cidade das Luzes usufruía de eletricidade, radiofone, novos túneis do metrô e saneamento, tornando a vida mais apropriada e confortável. O nível de certeza no seu regulamento de urbe adiantada e competente fez com que fossem desconhecidos os diversos sinais e advertência de que estava eminente a ascensão das águas do Rio Sena. Após o verão seco de 1909, seguiu-se um inverno rigoroso, que se diferenciou por meses de chuva torrencial e infindável. Entre os dias 21 e 28 de janeiro estas aguaceiras culminaram com uma elevação das águas do Sena de cerca de 8 metros. Eu estava lá. Vivi em Paris até os dez anos. Minha mãe teve quatro filhos, sendo eu o caçula de três irmãs: Valentine, Mireille e Cécile. Nossa famíla mudou-se para a cidade de Lens, região mais pobre da França. Em Lens estudamos e acabamos de crescer. Aos dezoito anos morri em um acidente de trem, eu, Valentine e meu pai. Muito certo hoje eu sei era o imenso amor que o velho Frachesco nutria ´por Valentine. Meu pai amava a filha na como se devem amar pai e filha, e Valentine também, desde mocinha, não saía de perto dele, e sempre que podia  sentava em seu colo, agarrava seu pescoço, penteando com a língua o seu bigode. Valentine amava o pai como não se devem amar filha e pai. Nas viagens de trem a Paris, nas que fui poucas vezes com eles, em uma delas ouvi Valentine falar baixinho com o Sr. Frachesco: “Mamãe ia ficar uma fera se descobrisse que nós somos amantes, não ía?", no que papai, com os olhos de bode, retrucou, em baixo tom: C' est bien tout?". Não. Isso não é tudo. Nada está bem. Restam mais pincelas.

(continua)

Acreis, 18/01/2013, Sta Cruz

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

A Estrela Amanhece


Vamos dançar este tango
que toca na vitrola
Vamos à viola ?
Ao som do tango
não tombo nem titubeio
pois trago um trago a mais
na veia.
É tiro e queda ,
credo e cruz!
Quando tiro você pra dançar
a poeira sobe,
Sua saia arrodeia,
sobe e desce,
a alegria , a alegria,
a alegria, ah! a alegria !
Então toda ela acontece!
É muito bom sorrir
enquanto dançamos.
Evoé , Baco !
Evoé , Deus !
Saravá , minha Mãe!
A estrela amanhece.


ACRES,18/01/2013

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Escuridão da Noite - III

Esse trecho que vou contar é um pouco da historieta de uma das minhas existências, que se passa no começo do século 18, quando abrolhei parido em terras brasileiras (norte-nordeste do país). Nasci em uma linhagem rica, sendo meu pai um famoso político e dono de muitas estâncias. Eu nunca  pensei em ser endinheirado e poderoso. Ainda adolescente eu tinha uns  sonhos esquisitos. Sonhava que de tudo eu sabia: matemática, filosofia, ciências, línguas estrangeiras e mais coisas. Quando acordava ficava lembrando dos meus sonhos e agia como se realmente eu soubesse de tudo. Minha mãe ficava assombrada com aquilo. O pior é que faziam questões para mim e eu replicava. Não sei se certo ou errado. Só sei que já nasci sabendo ler e escrever. Quando fui para a escola não tinha doutor que me entendesse. Fui diplomado sem nunca ocupar um assento em sala de aula. Diante daquela situação, minha mãe resolveu procurar um vigário na cidade, para me rezar. Minha tia falava que era pra me esconjurar.  Chegamos na igreja pela manhã. Olhei para o pároco e ela me pareceu ser  um tanto insano. A sós comigo, falou que rezaria missa para mim em troca de ensinar-lhe tudo que eu sabia. Mas o que sabia se apenas sonhava? Percebi que diante da sua ambição, o padre almejava ser papa, antes de torna-se santo. Falou-me que eu deveria construir um teto, com inteireza, deferência e amando os achegados sempre. Dias depois, soube através dos periódicos da cidade que o clérigo acabou louco e trancafiado. Meus planos então foram aprazados. Conheci Margarida e ela abrolhou em minha vida, e por ela me cativei perdidamente. Fazíamos planos matrimonias quando Margarida conheceu outro rapaz, Luiz Pires, com que logo se matrimoniou, teve filhos e foi habitar em Sergipe. Senti-me densamente vexado, coração cheio de aversão, rancor, invocando desforra. Diante de tal amargura, dediquei-me ao sacerdócio, tornando-me clérigo em quinze anos, indo catequizar em terras sergipanas, a mando da igreja católica. A estrela, tal qual carta de tarô, colocou-me em presença de Margarida, voltando o ódio à lembrança, mas sentindo que ainda a desejava. Tentei conquistá-la, mas não consegui. Margarida resistia bravamente às assaltadas, porém Luiz Pires não demorou a perceber o meu cerco febril por sua majestosa e leal companheira. Luiz Pires resolveu mudar-se para a Bahia com toda a sua família. Eu pensava e queria somente caçar, acusar, difamar, fazer intrigas, mentir, combater, agoniar e chacinar. Não demorou muito e descobri onde Luiz Pires estava. Luiz Pires foi aprisionado, denunciado e entregue a mim, por ordem de seus superiores. Luiz Pires foi levado às grades infectas, onde passou martirizantes penúrias e tormentos: arranquei-lhe as garras e os colmilhos, despedacei os seus dedos, destronquei  seus pulsos, incinerei as solas de seus chispes. Margarida muito sofria em pensar o que estaria acontecendo ao consorte. Foi enfim procurar-me entre lágrimas, implorando  cessação e misericórdia. Prometi a ela Luiz Pires de volta, desde que a mim se adjudicasse. Foram aversões que acabaram em anuência. Sem acordo, marido morto. Depois de assombroso pacto, Margarida vai a Luiz Pires. Contempla-o, desespera-se, e não consegue ocultar seu horror por mim. Percebo sua repulsa, e eu não consigo apreender aquele altivo amor que banha o corpo de Luiz Pires com lágrimas. Por não conseguir o amor de Margarida, termino por cegar Luiz Pires, cavando seus olhos com baganas de ferro em brasa. Após dois meses à liberdade, Luiz Pires suicida-e para não mais fazer sofrer sua adorada Margarida.

(continua)

Acreis, 13/01/2013 - Belford Roxo

sábado, 12 de janeiro de 2013

Escuridão da Noite - II

O vento que aqui sopra neste momento  fecha as páginas do que fui,
Carregando e espalhando minhas cinzas pelo mundo todo.
As páginas do que fui são então rasgadas em mil pedaços,
E, como se não bastasse, são lançadas em uma fogueira e queimadas,
Para que o bom e velho diabo jogue suas cinzas no ar.
Isso para mim é uma dádiva. Um salmo que até hoje é cantado pelos pecadores.
Já sofri e padeci o suficiente. Durante toda a semana permaneci triste e derramei
Muitas lágrimas amargas. E assim prossigo ousadamente em frente.
No portão do cemitério imploro para ali trabalhar.
Faço o máximo que puder, sem me importar com o salário.
Sou ainda o mesmo homem de ontem e de anteontem.
Tudo no princípio é escuridão. Da escuridão saímos nós.
O sol apareceu depois. Primeiro ficou solto nos desertos.
Depois andou pelas cavernas. Apareceu nas encruzilhadas de aventureiros e bandidos.
De viajantes e falsas mulheres-falsas.
Passado um tempo eu morri. Tive primeiro os olhos comidos, e depois o resto do corpo.
Até hoje guardo comigo a luz do meu último sol.
Meu coração anda mais disposto devido ao vinho, e vou, sem ser levado,
À procura dos animais da floresta, das aves do ceú e daqueles que rastejam na terra.
Meus parentes e toda a minha família sepultaram-me alhures sem a minha presença.
Preciso agora de ar puro e água não poluída, pois cansei de ficar costurando a minha mortalha.
Não pensei no que faria quando viesse a morrer, por isso o meu interesse pelo ocultismo,
Pelos lampejos ocasionais de visão profética.
Em meu testamento foi dito que o balde cheio de ouro caberia à irmã mais velha,
E à irmã mais nova o ouro. Ao caçula, por sua vez, a pá. A hora já é chegada.
As minhas palavras não consistem em palavras persuasivas de sabedoria humana, e nem tampouco
Profetizo a quem nunca me deu ordem.
Dou mais atenção à possibilidade de que as forças tecnológicas, econômicas e sociais venham a ter
Consequências mais desejáveis, de produzir resultados extremamente benéficos, muito mais do que
Ingenuamente se presume.
Que sabedoria tinham os sábios, que foram envergonhados, espancados, presos e mortos?
Eis que não repudiaram ou rejeitaram a palavra do Senhor; que sabedoria pois tinham?
A caminho da Verdade cairam os verdadeiros e os falsos profetas, também os doutores,
Que introduziram encobertamente heresias de perdição em todas as suas epístolas.
Como sou ainda miúdo, assim como fui no meu berço, tento imaginar-me eterna criança
A calcular como seria a mãe que um dia terei e se haveria amor por mim em seu olhar.
Nascerei uma criança de uma jovem mãe e de um pai desconhecido, e haverá no mundo
Tanta alegria por mim menino que todos irão me venerar como a um deus porque nasci do amor.
                                                                

(continua)

Acreis, 12/01/2013 - Belford Roxo
.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Escuridão da Noite - I

Sempre em minha vida acontece um episódio inesperado.
Não consigo deixar de lembrar e nem conseguir esquecer.
Desejava varrer da memória não só isso,
Mas  tudo o quanto pudesse.
Minha vida nunca completou-se...
Nem em minha morte!
Minha biografia principiava a ser conhecida nas redondezas.
Dizem que minha alma de estrangeiro é aguardada no Céu
Para que de lá seja enviada ao Inferno.
A minha urna foi fechada e posta num nicho do templo,
Até que fosse chegado o dia do meu enterro.
Eu não pertenço mais ao seu mundo.
Tudo em mim não se parece mais comigo.
Olho para mim, ainda rapaz, cheio de curiosidades,
E vejo certa semelhança com meu pai, já defunto.
Os olhos escuros. As mãos... As mãos tão grandes!
A boca sem dentes...A conformação do crânio!
Abro meus olhos e vejo Deus sentado diante de mim.
Ele me fala que tudo será julgado não pelo que fiz ou não fiz,
Mas sim pelo que eu pensava.
Na minha vida vivi isolado durante todos aqueles anos.
Isolado, não -falo de mim para mim.
Tinha as crianças que recolhia e os mendigos que alimentava...
Em nada tenho fé. Mas tenho amor por tudo que faço.
Hesito à porta oculta das trevas.
Penso que tenha algum ente espiritual, para que, animado desse propósito,
Tente sentar na cadeira mais alta dessa imensa biblioteca.
O meu prazer é agora escolher entre essas palavras uma que sirva para mim:
Árvore, flor, noite, ódio, ave, casa, ninho, amor, telefone, vida, morte, fome, vinho,
Quadro, mesa, pedra, abajur, régua, televisão, açúcar, janela -e poder pronunciá-la
Quando me sentir totalmente sozinho, à luz do dia, na imensa sala desta mansão.
Será ela a palavra consoladora da minha alma. E será escrita para ser lida
No mais longo trecho de um livro santo. Será a palavra de Deus, na significação
De tudo quanto existe.
(continua)

Acreis, 11/01/2013, Sta Cruz/RJ

Semeadura

Meu amor, não fale para ninguém,
Mas todas as noites rastejo debaixo da cama
Procurando o estojo de madeira
Que você me deu,
Onde guardo nossas vozes mágicas.
Antes eu as guardava
Numa caixa preta
E costumava escutá-las todas as noites,
Até que uma outra voz, também mágica,
Setenciou o seu fim.
Estamos purificados dos espíritos maus
Depois de termos arrendado
Nossas almas por um bom preço.
Bem sei que seu vestido é de aluguer
E que seus sapatos precisam de solas novas,
Mas volte para minha casa,
Que não é mais assombrada.
Vamos habitá-la de novo.
Andar pelos aposentos
E descansar no quintal,
Onde assistiremos a semeadura da primavera.
Nossos caixões estão prontos,
Simples e bonitos.
Vamos pedir para que nossos enterros
Sejam em nossas terras,
Na encosta sombranceira
Aos campos de arroz.


Acreis, 11/01/2013, Belford Roxo.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Voz De Noiva

Oh, menina... Perdão, minha senhora...
Hoje não devia ter-se levantado tão cedo.
Tens ainda os lábios encarnados
E teu rosto este tom de pérola.

Tua voz é de noiva,
Tão doce como um canto de ave.
Permita-me tocar nos teus cabelos negros,
Lisos e brilhantes de patroa.

Passo a acariciar o teu corpo
Com minhas mãos untadas de óleo perfumado,
Desenhando em tuas costas
Flores e pássaros.

Envolvo teu pescoço para beijar-te.
Ficar olhando teus olhos tímidos e graciosos.
Dá-me os brincos de jade, tu me pedes,
Com tua voz de noiva, nítida e bela,
Tão feminina e tão discreta.

Seguro firme os teus ombros
E sussurro em teu ouvido:
Se fosses feia, ter-te-ia estrangulado esta noite.
Detesto as mulheres feias.

Acreis, 09/01/2013, Belford Roxo

LinkWithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...