domingo, 25 de novembro de 2012

Todas as Cartas de Amor são Ridículas

Álvaro de Campos
 
       Todas as cartas de amor são
       Ridículas.
       Não seriam cartas de amor se não fossem
       Ridículas.        Também escrevi em meu tempo cartas de amor, 
       Como as outras,
       Ridículas.
       As cartas de amor, se há amor, 
       Têm de ser
       Ridículas.
       Mas, afinal,
       Só as criaturas que nunca escreveram 
       Cartas de amor 
       É que são
       Ridículas.
       Quem me dera no tempo em que escrevia 
       Sem dar por isso
       Cartas de amor
       Ridículas.
       A verdade é que hoje 
       As minhas memórias 
       Dessas cartas de amor 
       É que são
       Ridículas.
       (Todas as palavras esdrúxulas,
       Como os sentimentos esdrúxulos,
       São naturalmente
       Ridículas.)

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Poema de sete faces




Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens

que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:

pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode

é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste

se sabias que eu não era Deus,
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo

se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer

mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.
Carlos Drummond de Andrade

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